segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Morena.



Olha só, morena. Quanto tempo faz que a gente não se vê? Você pode não lembrar, mas você nunca deixou de ser você. Aquela menininha com o chiclete de maçã que um dia me disse “eu ainda caso contigo, guri”. Tão tonto e tão moleque, eu não entendia de flores, amores, futuro, vida adulta, responsabilidades e blá, blá, blá. Vai ver era isso que fazia a gente dar certo na hora do recreio. E o sinal batia, mamãe chegava, você me dava um beijo na bochecha e o seu vestidinho florido desaparecia na esquina do fim da rua.
Olha só, morena. Hoje eu abri o jornal e parece que a chuva vai apertar amanhã. Tá levando guarda-chuva? Engraçado que quando eu ouvi “guarda-chuva” pela primeira vez, eu pensei numa caixa. Um guarda-água pra gente usar quando quisesse viver um amor líquido de cinema. Morena, essa gente do jornal é tão sem esperança. Transformaram as tragédias em rotina. É que as alegrias de bolso não dão manchetes. Elas são bobagem perto do caos. Daí eu viro a página e vejo o seu rosto sorrindo pra mim. Será que eles acreditam que a gente ainda pode salvar esse mundo?
Olha só, morena. Você não mudou nadinha. Hoje em dia eu só te vejo na TV. Você brinca de vilã, doce, sonsa e mocinha e mal sabe que, no fundo, me faz bem. Você diz que não entende o que eles vêem em você. Mas é que a capa e a fantasia te caem bem. Super-heroína, sabe? Aquela mesma que largou meu Saturno para tentar salvar o seu. Você me liga às vezes pra contar daqueles dias. Espero que não faça frio aí. Leva um casaco e ma maçã e me manda um e-mail. Se isso não bastar, eu corro aí. Mesmo que eu não me destaque na sua multidão de seguidores e seguranças, eu corro.
Olha só, morena. O relógio anda voando. Eu peguei meu violão e musiquei a gente. E o tempo fez ciranda de nós enquanto eu fazia esse som. Talvez você acorde meio tarde demais desses seus novos planos e se lembre do início antes do fim. No próximo fim de semana eu espero mais um pouco para te ver na piscina me olhando com algum carinho que a gente tem. Fico segurando a sua lancheira para não perder tempo no nosso recreio. Mesmo sabendo que uma hora o sinal bate e você desaparece na esquina de novo. Amanhã não tem aula e eu não vou te ver, mas eu corro aí. No fim, eu sei que você sempre se lembra de mim quando dá o comercial entre as suas cenas. É por isso que eu nunca mudo o canal da TV. E nem tiro aquele anel que você colocou no meu dedo uma vez.